segunda-feira, 9 de abril de 2012

Crianças


Crianças

Dos lábios rosados das crianças,
Ainda se soltam
Filas de beijos e gostos doces
Em torno de corpos e rostos e mãos,
Que se querem
E esperam,
Indiferentes aos fios decorados pela razão
E pelo mastigado enfadonho
Dos que se acham grandes
E com carta-branca
Para embrulhar e atar
O que ainda é puro como o amanhecer.

É clara e bela a bola inundada de lama,
Comprada pela madrinha
Numa quarta de feira,
E que a criança ainda agarra nas mãos,
Depois de a apanhar do chão
Que segura o bairro da cidade,
Nesse chuvoso começo de tarde,
Em plena infância,
Só para que a pata dos homens
Não a esmague
E encha de saberes feitos
E cremes para esconder as rugas.

Jamais os jardins secarão
E as flores perderão a sua cor
Se as pedradas sinceras das crianças,
Aquelas que forem lançadas
Bem lá do fundo do não entendimento,
Continuarem a estilhaçar
As redomas envidraçadas
E postiças dos que calculam tudo
E que até conhecem os sítios
Onde se prostituem os gostos
E os azuis que cobrem o céu.

Mesmo que não volte a chover
E da aridez dos desertos
Já não escorra a força que move o tempo,
A verdade dos sentimentos e dos dias
Continuará a levantar a esperança,
Apenas porque as crianças ainda andam de baloiço,
Gostam de histórias de fadas
E não se importam de ter a cara suja.

Carlos Afonso

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