quinta-feira, 6 de novembro de 2014

UMA HISTÓRIA PARA MIGUEL MONTEIRO (Passado mais um aniversário da sua morte, uma homenagem sincera a um ilustre fafense)





   UM ENCONTRO NA BRASILEIRA


Para quem consegue ler os pequenos indícios que os dias oferecem aos incautos humanos, por vezes, colhe surpresas que nem o destino conseguiria melhor. Não admira, por isso, que uma noite amena de Novembro consiga ser mais intensa do que as imensidades de Junho, ou uma mera flor outonal esparja mais aroma do que as rosas de Maio. É por estas e por outras que certos minutos têm imensuráveis encantos, e o velho Estêvão tenha razão, quando afirma: “O mais belo numa seara farta não é o trigo que nela se venha a colher, mas, sim, no cereal que gostaríamos que ela nos desse.”
Naquela noite, as ruas de Fafe não me foram indiferentes, bem pelo contrário. O sossego da hora e o recato adormecido dos poucos transeuntes convidaram-me a calcorrear a grandeza arquitetónica que define o centro da cidade. Reminiscências, vozes surdas, esculpidas nas vidraças, e uma humidade agarradiça, própria da época, conduziram-me a vontade. Como a iluminação pública não me mostrava a verdade toda, a dada altura, dei por mim a entrar na Brasileira.
Este simpático café, localizado bem no centro da cidade, não tinha mais de uma dúzia de pessoas. Para além do proprietário, um amigo que muito considero, pude enxergar que as demais iam dando duas de conversa, interrompida, de vez em quando, pelas chamadas de um televisor, que se encontrava encostado ao sítio do costume.
Depois de tomar o que a ocasião me pediu, deixei-me estar por ali. E porque me apeteceu, comecei a reparar no que os meus olhos me ofereciam. A cavaqueira amena dos companheiros de espaço continuava. A televisão pouco me dizia. Alguns bolos e outras guloseimas, próprias destes ambientes, pareciam dormitar nas suas calorias. Só a abrangência do momento e a minha apatia espontânea me atraíam. Quase sem querer, inquietei-me. De seguida, pareceu-me ver uma luz diferente, vinda do exterior, que parecia querer confundir-me o raciocínio. Ainda resisti, mas foi por pouco tempo.
Senti passos (e agora não sei se foi sonho se realidade). Uma voz algo ausente, mas minha conhecida, abordou-me. O detentor da mesma pediu licença para se sentar. Numa atitude cordial, como tento sempre ser nestas ocasiões, disse que sim, ao mesmo tempo que reparava na sua fisionomia. Que emoção!
Do que aconteceu logo a seguir, meus amigos, só vos conto alguns excertos, porque os demais pormenores ainda não os consegui entender. O que vos asseguro é que, a dada altura, dei por mim a escrevinhar, num papel que retirei do bolso, uma frase demasiado importante para o dono da voz que a inspirou «Fafe dos Brasileiros». Também vos assevero que aquele homem de meã de figura, plenamente convencido do que dizia e dono de um olhar oceânico, me fartou, naqueles inesquecíveis instantes, de histórias e nomes de fafenses que escolheram o Brasil para emigrar. Claro que também me falou dos seus regressos, das riquezas que trouxeram, dos palacetes que construíram e das suas bem feitorias. Não se esqueceu, igualmente, de me esclarecer algumas dúvidas e de me acrescentar algumas curiosidades que só um homem sábio pode clarificar. Depois, retocou de leve os óculos, e enquanto se despedia, apontou para o que eu escrevera e pareceu estremecer. Depois, sorriu e recolheu-se à eternidade.
É evidente que eu entendi a mensagem.
E porque tinha de ser, acordei para a realidade, compus os óculos, pois pareceram-me desacertados, e respirei fundo…
Ora bem, do que temos estado a conversar, alguma coisa não bate certo ou, se calhar, tem todo o sentido.
Na Brasileira prosseguia a conversa. A televisão insistia no que estava programado. No meu relógio eram quase as onze.
Levantei-me, peguei no papel com os tais dizeres e apertei-o com convicção. Despedi-me e saí.
A noite continuava quase igual…

Carlos Afonso (2011)


segunda-feira, 15 de setembro de 2014

UM GESTO DO TAMANHO DE MUITOS SENTIMENTOS... (Obrigado!)





Na semana passada, quando abri a caixa do correia, encontrei no seu interior uma pequena folha com algumas palavras e um flor desenhada. A flor era bonita e a frase dizia assim:
 "Professor, passamos por sua casa para o cumprimentar, mas como não está, deixamos-lhe este pequeno bilhete. Obrigado por tudo. Nunca o esqueceremos. Foi um prazer ser seu aluno durante 3 anos. Pode contar sempre connosco. Bjs"

Claro que o bilhete estava assinado. Claro que telefonei a agradecer tão maravilhoso presente!

E porque me emocionei com o que me colocaram na caixa do correio. E porque gosto de ser professor. E porque, para mim, os alunos ficam eternamente agarrados ao meu coração, aqui deixo um simples poema como prova da minha estima, carinho e saudade:


Voltai a esta escola…


Os dias de cada vida
Não são todos iguais.
Às vezes, atiram-me lama ao rosto
E cobrem-me de imundices vazias.
Outras vezes, obrigam-me a caminhar,
Na direção que desejo alcançar,
Mas não quero que acabe assim.

Eu sei que os destinos têm de andar…
Eu sei que tenho de soltar do peito
Os sentimentos dos que vão,
Sem saber se tornarão,
Sem saber se me dirão
O que ainda não senti!

Tempo, não roubes o sonho dos que têm de sair
Nem me oprimas com esse fim
Que ainda não acabou,
Mas que tem de subir à morada das estrelas
E à foz onde começa o mar
E cessa o meu tocar.

Ai… como as estações estão certas!
Mesmo que os ventos destruam a calma dos prados
E as flores percam a cor
E se afastem das certezas primaveris…

Basta.
Os meus choros não podem apagar os risos dos que querem ir adiante.
Os caminhos têm de seguir o seu rumo
E as vozes não podem calar-se antes de Deus as escutar.

Ide, amigos do peito, aves da esperança, corações de mel!
Segui o rumo das aves,
Bebei a clareza das nascentes,
Colhei os frutos das vontades,
E amai o nascer do luar.

Um dia, mais tarde,
No momento em que os vossos olhos
Já beberem a seiva de outros peitos,
E os vossos corpos roçarem outros prazeres,
Iguais à plenitude dos anjos,
Voltai a esta escola
E perguntai por mim!


(Com carinho, Carlos Afonso)


quarta-feira, 2 de julho de 2014

O CORREDOR DO PISO SETE DO IPO DO PORTO É A AVENIDA MAIS LONGA DE TODA A CIDADE…





Em todas as cidades grandes há avenidas feitas de destinos, pessoas, carros, barulho, árvores, flores na primavera, sol e chuva, dias e noites, sonhos e vontade de seguir e de chegar…
Em todas as cidades grandes há avenidas marcadas por um princípio e por um fim.

O corredor do piso sete do IPO do Porto é a avenida mais longa de toda a cidade…
O corredor do piso sete do IPO do Porto começa e acaba nos vidros de duas janelas que mostram o que apenas deixam ver…
Os olhos que olham veem:
 pedaços de cidade
 luz dos outros
sons desiguais
alguns acenos
 passos apressados ou parados
 metas de olhares que ainda procuram e…  quase desistem
 ramos ao vento
e aldeias e vilas e casas de longe…  gravadas no coração dali…
e…

O corredor do piso sete do IPO do Porto deixa-se percorrer por tubos, sangue, roupa suja, cheiros sem flores, feridas à mostra, caras por lavar, brancos diversos,  remédios que enganam e…  homens e mulheres e velhos e jovens e mães e filhos e irmãos e…
estes sofrem
aqueles  sofrem
os outros partilham dores
e os outros trabalham…

O corredor do piso sete do IPO do Porto é a avenida mais longa de toda a cidade e…
 neste corredor há uma mulher que gosta de tulipas amarelas, um rapaz que quer ir a Fátima a pé e um homem que gosta de fazer pizas…

Carlos Afonso


quinta-feira, 26 de junho de 2014

NOTA INTRODUTÓRIA AO LIVRO SOLIDÁRIO «O SÍTIO ONDE MORAM AS CORES DO ARCO-ÍRIS»


  


 "Não podemos ter medo da solidariedade"
                                                                               Papa Francisco


Uma das maiores grandezas da disciplina de Literaturas de Língua Portuguesa é a possibilidade que oferece aos alunos de, e para além de poderem usufruir das obras dos vários autores de Língua Portuguesa, darem azo à sua criatividade, interligando-se sempre com o meio que os cerca. A palavra, a alma, o sonho, o coração e o engenho surgem, assim, juntos e em sintonia.
Ao estudarmos o poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade, as suas palavras soaram alto no nosso entendimento e a brisa afagou-nos o olhar.
O poeta disse:
 «A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade.»
E nós respondemos:
«As frases estão certas. O poeta tem razão. A felicidade existe. Temos de SENTIR O CORAÇÃO!»
O movimento “Sentir o coração”, inspirado na poesia de Carlos Drummond de Andrade, nasceu na Escola Secundária de Fafe, numa das minhas aulas de Literaturas de Língua Portuguesa, com o objetivo de ajudar um dos alunos, que precisava da nossa atenção e carinho.
O Nuno sorriu! A nascente brotou… e o espírito solidário, envolto em palavras e orvalho, começou a caminhar para o mar.
  O primeiro passo foi dado com a realização de uma oficina de escrita no Centro Social e Paroquial de Revelhe, regida pelos alunos do 12ºI, de onde surgiram os primeiros trabalhos, e o repto para a edição do livro O Sítio Onde Moram as Cores do Arco-Íris começou a ganhar forma.
A onda de solidariedade foi crescendo. Aos primeiros textos e desenhos, construídos pelos meninos do Centro Social, outros se juntaram, com a colaboração de vários autores de todas as idades. Aos poucos, e acariciado pelas cores do amor, o livro O sítio onde moram as cores do Arco-Íris mostrou-se no horizonte.
 Que lindo! Que perfume!
            - O livro está pronto. E agora? Como vamos editá-lo? - alguém suspirou.
            Uma das maiores certezas que nos acompanha é que Deus existe.
            Deus escutou as nossas preocupações e permitiu que mais pessoas se associassem ao movimento “Sentir o coração”. A Naturgipe ofereceu-nos a sua força e outros corações ofertaram-nos gestos, sorrisos e tempo. O pequeno regato ganhou caudal e o mar começou a ficar mais perto.
            Da venda do livro O sítio onde moram as cores do Arco-Íris nascerão outros livros que irão enriquecer a jovem biblioteca do Centro Social e Paroquial de Revelhe, também ela germinada no movimento “Sentir o Coração”.
            Hoje, as crianças já podem olhar, com mais clareza, o céu e construírem as suas histórias com final feliz. Amanhã, o Arco-Íris continuará a mostrar as suas cores definidas e repletas de esperança.

            Obrigado!


Carlos Afonso

segunda-feira, 9 de junho de 2014

O SENTIDO DAS PALAVRAS...



Depois de um dia inteiro de reuniões na Escola Secundária, e depois de um fim de semana no IPO, preocupado com a saúde de um familiar que me é muito querido, abro a página e vejo o que as minha palavras provocaram, e que me estão a provocar sentimentos contraditórios.
O que eu mostrei no Club Fafense foi o meu descontentamento perante um silêncio que não entendi, e nem entendo, perante um evento cultural, que a associação Atriumemoria estava a organizar, e que tinha a colaboração de muitas Associações de Fafe e de alguns lugares ligados a Camilo Castelo Branco. De facto, já há meses que muitas pessoas estavam a trabalhar intensamente nessa iniciativa que considerávamos importante para Fafe e para a literatura.
Como o silêncio foi a resposta da entidade que sempre apoiou estas iniciativas, ficamos deveras preocupados, e a mim causou-nos imensa tristeza ter de cancelar o que julgávamos importante.
Ao dizer, de uma forma sentida que iria mudar de "lugar" para continuar a viver a cultura, como gosto de a viver, estava a salientar que trabalhar com outras terras ligadas a Camilo seria o meu próximo objetivo. Igualmente me iria afastar de tantos silêncios que a mim me causam muito mau estar. Claro que o farei, mas continuarei a viver em Fafe, a trabalhar pela terra que me acolheu, assim como a desenvolver atividades que não me causem tanto cansaço e certas incompreensões.
Agradecia que os amigos não fizessem desta situação um fim do mundo. Agradeço as mensagens que tenho recebido, pois nunca imaginei que o meu desabafo (o meu grito de alerta) causasse tanta confusão. Mas penso que já chega, pois as coisas já começaram a mudar e para MELHOR.
Neste momento estou ligado a um projeto pedagógico que considero muito interessante, ligado também, à Atriumemoria, e que já foi apresentada a versão mais popular em Estorãos, ligado ao Ciclo do Pão, e na próxima quinta feira será apresentada a versão mais escolar na Escola da Devesinha,a partir de um conto que escrevi e que se chama «O velho e o grão de milho».
Peço também a atenção para uma grande iniciativa solidária que estou a coordenar com os meus alunos, e muitos outros amigos, e que tem como base um livro solidário a favor da criação de uma Biblioteca Escolar no Lar da Criança de Revelhe. O livro já está à venda em vários lugares e chama-se «O sítio onde moram as cores do Arco-Íris, e que pedia a todos os amigos, e se assim o entendessem, que o comprassem e que ajudassem as crianças que precisam da nossa ajuda.
Como os amigos podem ver, eu continuo a lutar por aquilo em que acredito.
Amo Fafe e todos os fafenses, não sou homem de virar costas a quem me quer bem, mas tenho o direito de alertar para situações que não podem voltar a acontecer.
E como um amigo sincero me confidenciou numa bela mensagem, acabo este meu texto de uma forma que considero certa, e que dizia mais ou menos assim " se amamos as cores do Arco-Íris e o que elas significam, também temos de compreender as tempestades, pois sem elas não há Arco-Íris."
Sempre gostei de "construir pontes" entre as pessoas, e é o que continuarei a fazer.
Agradeço a vossa preocupação, mas vamos ficar por aqui.

Com amizade

Carlos Afonso

terça-feira, 27 de maio de 2014

NO dia 30 de maio, O ARCO-ÍRIS PINTARÁ AS TERRAS DE FAFE

NO dia 30 de maio, O ARCO-ÍRIS PINTARÁ AS TERRAS DE FAFE

Na noite do dia 30, traga uma cor do arco-íris e entre numa história mágica «UMA AVENTURA NO JARDIM DOS SONHOS»

Aberto a todos os que têm um coração solidário, o lançamento do livrosolidário será o motivo maior para acontecer um grande evento solidário, no campo de jogos Escola Secundária de Fafe, com a presença de vários grupos musicais e outros momentos recreativos.
No dia 30, venha à Escola Secundária, traga uma cor do Arco-Íris (roupa/fita/...) e entre numa aventura mágica «Uma aventura do Jardim dos Sonhos»
(Esta iniciativa tem como objetivo ajudar as crianças e jovens do Lar da Criança de Revelhe. A criação de uma biblioteca é uma das principais intenções, para que as crianças tenham as condições necessárias para que o seu futuro seja mais feliz)

Por favor, divulgue esta iniciativa e ajude as crianças a sorrir...

sexta-feira, 16 de maio de 2014

ALMA DOS CANAVIAIS E OUTRAS HISTÓRIAS - um livro de viagens?



            Nestes últimos anos, muitas histórias compuseram a minha vida, enrodilhadas num permanente caminhar por espaços, pessoas, sonhos e vivências. Assim, e porque os momentos também devem ser partilhados, Alma dos Canaviais e outras histórias… não é mais do que um aglomerado de pedaços de mim, num permanente interagir com os outros.
De Trás-os-Montes ao Minho, de Fafe a Alfândega da Fé, do norte ao sul de Portugal, de Paris a Moscovo, as palavras soltam-se num irrequieto viajar.

                                      
                                                           Pedido
                                       Nunca ansiei o brilho das estrelas…
                                       Jamais desejei a precisão dos espaços…
                                       Recusei sempre o devaneio dos ventos….

                                       Peço apenas, aos que têm sonhos por cumprir,
                                       Para que leiam os meus sinais,
                                       Escutem o murmúrio das palavras que escolhi,
                                       Colham alguns pedaços de mim
                                       E amem a frescura amena dos canaviais…

           
“É que, as páginas deste livro são desenhadas pela bipolaridade dos géneros que nele convivem; pela diversidade das temáticas que lhe emprestam o colorido; pelos espaços de memória que permite revisitar; pela evocação das figuras que se pretende homenagear; pelo “prazer da leitura” que poderá ser saboreado, em função do sortilégio da dança das palavras, gravadas ora à maneira de poemas líricos, ora de reflexões e relatos em forma de crónica quase diarística.
Trata-se de efabulações surgidas às golfadas da alquimia de uma alma consabidamente poética, mas alternando com narrativas que a correnteza das rotinas fez brotar de feição continuada. Nestes textos, ressaltam retalhos de um olhar penetrante e perscrutador do quotidiano, que a todos nos circunda, embora escape ao nosso olhar normalmente demasiado ocupado, distante e alheado.”
                                               António Teixeira (autor do prefácio)


 A obra Alma dos Canaviais e outras histórias vai ser apresentada no dia 23 de maio,  pelas 21h30, na Sala Manoel de Oliveira, em Fafe.


Carlos Afonso