Porque
as 4ªs JORNADAS LITERÁRIAS DE FAFE se aproximam (19 a 28 de abril), sinto
necessidade de partilhar alguns excertos da entrevista que dei ao jornal “Notícias
de Fafe”, de 5 de abril de 2012,
centrada nas Jornadas Literárias de Fafe. Será que o passado tem razão?
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CA- Em primeiro lugar, quero agradecer o convite simpático que o
“Notícias de Fafe” me fez para esta entrevista. É uma honra poder colaborar com
este jovem e promissor semanário fafense. Conheço alguns dos seus excelentes
profissionais, o que me leva a acreditar que Fafe está mais rico, pois a
cultura e as nossas tradições terão mais um espaço para se evidenciar.
NF - Em poucas palavras como descreve a cultura fafense da primeira
década do novo século?
CA – Nasci numa aldeia de Trás-os-Montes e, desde essa altura,
tenho percorrido muitas terras, conhecido muita gente e contactado com muitas
formas de fazer, sentir e promover a cultura.
A vossa
questão pede-me para descrever a cultura fafense na primeira década deste
século. Ora bem, em primeiro lugar quero dizer-vos que a cultura fafense tem
seguido um caminho positivo. Os responsáveis pelo seu incremento são pessoas de
bem e que eu estimo e admiro. São pessoas que têm uma forte sensibilidade
cultural e que sabem o que fazem. Claro que nem tudo tem sido perfeito, mas
isso é normal acontecer, pois os homens são detentores de falhas e pormenores a
melhorar. Fafe tem uma forte e diversificada vivência cultural, não podemos
esquecer que os nossos jardins, para além de flores, estão salpicados de muita
poesia fafense, o que me satisfaz muito. O apoio a autores fafenses, nas várias
vertentes, também tem sido uma excelente ideia que deve continuar. Se calhar o
que estava a faltar era uma cultura um pouco diferente, uma cultura que batesse
às portas das pessoas, que é o que está a fazer-se sentir com as Jornadas
Literárias.
NF - Como surgiu a ideia das Jornadas Literárias (JL)?
CA – A vossa questão remete-me não só para o ano de 2010, altura
das 1.ªs Jornadas Literárias de Fafe, como também para o tempo em que
organizava eventos culturais na minha pequena aldeia, ainda como estudante,
assim como para o tempo em que nas colónias de férias, durante as pausas
escolares, onde gostava de envolver todas as crianças e monitores em torno de
uma ideia. Graças a Deus que sempre consegui organizar momentos culturais de
que me orgulho. E o mais interessante é que as pessoas também se reviam neles.
Quando em 2010, e em conversa com
os meus alunos de Literatura Portuguesa, lhe confidenciei de que seria
interessante assumir uma atitude mais intensa e ativa perante a cultura e os
escritores de Fafe, eles foram os primeiros a incentivar-me e a colocarem-se do
meu lado. A partir daí, um rio que começou a nascer dentro de mim, nunca mais
parou. Conversei com alguns amigos que de imediato de juntaram a mim, assim
como a Diretora da Escola Secundária, Dr.ª Natália Correia, que sempre me
apoiou nestas iniciativas. A minha amizade com o Dr. Coimbra, um homem de muito
valor e que muito estimo, permitiu ligar-me à Câmara Municipal, o que veio a
consolidar o projeto das Jornadas e a lançá-lo no futuro.
NF - Que significado tem para si este evento cultural?
CA - Como devem imaginar, este evento cultural tem, para mim, um
valor incalculável. Às vezes, as pessoas admiram-se com o afinco que eu dedico
a esta iniciativa. Mas é a minha forma de embalar um filho de tenra idade que
ainda tem um longo caminho à sua frente para percorrer, continuamente envolto
em dificuldades e indecisões. Não admira por isso que quando alguma coisa não
corra pelo melhor, eu sofra e me preocupe. As Jornadas literárias não são
minhas. São de Fafe. Mas têm nas suas veias o meu sangue. Olho para esta forma
de fazer cultura como uma mais-valia para toda uma região e para todo um povo
que não quer esquecer as suas raízes e a sua alma.
NF -Considera que as JL abriram
novos horizontes para a cultura fafense?
CA - Eu sei que às vezes é mais
fácil tratar da cultura através do telefone, pois há organismos específicos que
permitem organizar eventos quase sem falhas. Há especialistas para isto e para
aquilo. Basta ligar e já está. As Jornadas Literárias são diferentes. Tudo
assenta no amadorismo, no gosto que se coloca nas coisas, na boa vontade das
pessoas, na verdade dos momentos, na cultura que mora dentro de nós. Esta forma
de tocar as pessoas faz com que novos horizontes se abram e que esta construção
cultural não tenha um limite definido. Há sempre qualquer coisa a acrescentar e
a limar.
Pessoalmente, penso que o que
está a acontecer em Fafe é uma espécie de necessidade de sobrevivência. O nosso
povo, as nossas instituições e associações têm os olhos postos nas Jornadas
Literárias e veem nelas uma forma de mostrarem o que de bom sabem fazer, assim
como uma espécie de janela que os ajuda a justificar a sua existência. Eu acho
que Fafe ainda vai ter muitas surpresas agradáveis, porque há muito querer na
nossa gente e gosto em mostrar o que de melhor têm.
NF - As JL arrastam multidões que lotaram o Multiusos e encheram o
centro da cidade. Existe segredo para esta mobilização?
CA - O segredo está no espírito das jornadas que mora bem no fundo
das pessoas. As Jornadas Literárias cheiram a verdade, a tradições, a povo, a
terra, a ar puro, a pedras, a alma, a coração, a fé, a ribeiros, a partilha, a
bairrismo, a esperança, a broa e a sobrevivência. O segredo das Jornadas está,
igualmente, no poder de união que se espalhou com o vento e ao ritmo dos sons
da verdadeira música minhota. O segredo das Jornadas está no facto de as
pessoas as sentirem suas.
NF - Como se consegue fazer tanto com tão pouco?
CA - As terras de Fafe são ricas em cultura, história e folclore.
As várias escolas que existem no concelho estão repletas de excelentes
professores e de alunos com muito engenho. As associações, as instituições, as
Juntas de freguesia, o Município e outros organismos não se importam de dar
tudo o que têm. A minha demanda e a dos meus colegas de ofício pelas nossas
freguesias permitiu-nos conhecer pessoas de excelência, o que ajudou em muito a
causa das Jornadas.
A ligação de Fafe ao Brasil é uma
mina a explorar. Para além disto tudo e muito mais, há certas pessoas que trabalharam
comigo que são o que de melhor existe em Portugal (…). Perante estes
ingredientes todos, tudo é mais fácil de confecionar.
Quando se têm os melhores
materiais, a sorte por companheira e um tempo favorável, consegue-se construir
a casa mais bela. Mas atenção, tudo tem acontecido, porque a dignidade e a
amizade nunca faltou nas atitudes dos vários agentes.
NF - O Professou “ofusca” figuras
da cultura fafense. Sente-se um homem invejado?
CA - Eu não sei se ofusco certas
pessoas ou se crio inveja em alguém. Se isso acontece o mal não está na minha
pessoa, está naqueles que não sabem ver a verdadeira cor das flores. Eu
defino-me como uma pessoa simples, incompleta, irrequieta, incauto, sonhador,
crente e amante do povo. Sou apenas um homem que gosta do que faz e nem sempre
acredita no que diz. Sou apenas um homem que gosta de ouvir as pessoas, sentir
os sentimentos e que ainda tem muito para aprender.
NF - O Município de Fafe tem, seguramente,
reconhecido o seu trabalho, (…)?
CA - O Município de Fafe sempre
esteve com as Jornadas Literárias. Sem a sua forte colaboração e apoio, este
grande evento cultural não chegaria ao que é hoje. Várias vezes reconheceram o
meu trabalho, assim como o dos amigos que comigo têm governado esta caravela de
cultura (…).
Digo de uma forma bem clara que
tem sido uma honra ter trabalhado com o Município de Fafe, e que nunca
esquecerei os gestos do Sr. Presidente da Câmara e dos Senhores Vereadores da
Cultura e Educação, de se terem trajado a rigor, terem subido ao palco e terem
calcorreado as ruas de Fafe, dando vivas à nossa história e à nossa cultura,
nestas últimas Jornadas. Estas atitudes dizem-me muito e mostram que os nossos
políticos também são feitos de sentimentos.
(…) Eu tenho vontade própria,
gosto de fazer o que a minha determinação me diz e, aconteça o que acontecer, e
enquanto Deus mo permitir, continuarei a trabalhar em prol da cultura e de
Fafe, seja de que forma for.
No meio de toda a vida que levo,
só tenho pena de não ter mais tempo e as condições necessárias para trabalhar,
com a dignidade que lhe é devida, a cultura que se espraia pelas nossas ruas,
praças, aldeias e lugares.
(…)
NF - A fasquia das JL está muito
elevada. Receia não ter condições para manter o nível do evento?
CA- (…) Eu disse no início desta
entrevista que as Jornadas são apenas mais um filho que brotou do meu sémen de
sonhador. Como era de esperar, muitos sonos ficaram por terminar, e algumas
circunstâncias ainda não estão totalmente limadas, pois há certos rigores de
percurso que me querem esconder aquilo que para mim não devia ser problema.
As próximas Jornadas têm quase
todas as condições para serem maiores e melhores. O problema é a fasquia a que
se chegou e as limitações que me perseguem. Quem estiver ao leme das 4.ªs
Jornadas Literárias de Fafe tem de ter tempo para sonhar, criar, orientar,
promover, escolher, limar, descansar, dormir, praticar desporto, ganhar o pão
de cada dia, ouvir, sorrir, olhar, escolher, calcorrear caminhos, incentivar,
representar, cheirar o jasmim. Será isto possível?
Por muito amor que se tenha a uma
causa, às vezes temos de esfarrapar o que mais queremos, olhar o céu, encolher
as mãos e chorar. Mas Deus é grande e o vento pode soprar de maré. Todos
sabemos que ninguém é insubstituível, por isso os rostos podem mudar, desde que
o motivo que semeou as Jornadas Literárias permaneça o mesmo. O importante é
querer e trabalhar em equipa.
NF - Acredita que as JL de
2013 possam surpreender ainda mais?
CA - O absoluto está para além
das estrelas e tudo pode acontecer. Se todas as condições forem criadas, as
Jornadas Literárias de Fafe poderão tornar-se numa referência mais global,
mesmo que a nossa imprensa nacional não dê por isso. O Brasil pode voltar a ser
um grande porto cultural a redescobrir, assim como o voltar a beber nas
nascentes que continuam frescas e puras bem no centro do nosso Minho. As
recriações históricas podem-nos levar a eras diversas, pois as terras de
Montelongo assentam em estruturas com muita dimensão e origens.
Fafe dos Brasileiros tem
todas condições para ir muito longe. A rota dos brasileiros por todo o concelho
pode ser uma realidade e a sua orientação de caminho de memórias será apenas
mais uma folha desta frutífera árvore visionária. Para além do que acabei de
dizer, (…) a ligação à Associação
Empresarial de Fafe é um ponto a relevar. Se as vertentes económica e turística
encarnarem as Jornadas Literárias, Fafe terá muito a ganhar. Não é isso que
acontece em Óbidos Medieval ou em Santa Maria da Feira?
Outro trilho a desenvolver está
na gastronomia fafense. Por que não uma confraria da Vitela assada à moda de
Fafe?
O juntar datas de renome para
Fafe, pinceladas de ar fresco e de literatura é outra maneira útil de construir
o futuro. É imprescindível redefinir eventos e mostrar resultados aos fafenses.
O dia 18 de março de 2012 foi apenas uma pequena parte do que se pode construir
nas terras de Fafe.
Na nossa cidade temos uma Escola
de Bailado, vários grupos de teatro e uma Escola de Música. Era importante que
se dessem a estas duas instituições condições para que elas fizessem grandes
produções no âmbito das Jornadas. É possível fazer tanta coisa… O importante é
fazer tudo com carinho, verdade, mais ordenado e prescindir de vaidades de
gabinete e de fachada.
NF - Há outros projetos pessoais
que gostaria de concretizar?
CA - Gostaria de continuar a
escrever livros para crianças, poesia e um ou outro romance. Gostaria de um dia
produzir um musical que tivesse Fafe no seu centro. Gostaria que o amor pela
minha família fosse eterno. Gostaria que o meu trabalho ajudasse os jovens a
olhar mais além. Gostaria de ajudar as nossas aldeias a incrementarem o turismo
cultural. Gostaria que o percurso pedestre literário «Caminhos de Camilo» fosse
o que eu quero que ele seja. Gostaria de ter as condições necessárias para
promover as tradições das terras que moram no meu peito. Gostaria que os meus
sonhos nunca me largassem. Gostaria de… Gostaria de continuar a ser quase
feliz. Obrigado
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