sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Em Fafe também nasceu Portugal



Em qualquer história que se conte ou escreva há sempre um motivo, uma inspiração, um princípio, uma hesitação, um desenvolvimento e um fim. Certeza óbvia a que esta minha criação não fugiu. Eu sei que nem sempre é necessário explicar ao narratário de qualquer história o porquê da mesma, para que não se desfaça o prazer da descoberta e o sentir subjectivo que, normalmente, dá cor à mesma. Mas, desta vez, uma inquietude própria de quem entende as preocupações de Fernando Pessoa na Mensagem, obriga-me a fazê-lo.
Na tarde 22 de janeiro, um dia após a abertura oficial de Guimarães capital europeia da cultura, fui passear por essa bela cidade repleta de história, curiosidade e gente bonita. O tempo estava ótimo e a minha vontade queria respirar a novidade do acontecimento.
Nas ruas asseadas, tudo estava a condizer. Os corações, símbolo maior deste estatuto de cidade de excelência, espreitavam em todas as montras e peitos humanos. Bem lá no alto, a Penha erguia-se imponente e espreitava risonha. Mais a baixo, o castelo, imagem de marca de Guimarães, mantinha-se atento e embandeirado. No sítio do costume, e permanentemente hirto na sua valentia, Dom Afonso Henriques segurava a espada e nem um bem-humorado grupo castelhanos, que por ele passou, o inquietou. De certeza que noutros tempos o nosso herói não reagiria assim.
Numa das ruelas da cidade berço, e no instante em que me apeteceu espreitar para o interior de uma loja, reparei num pequeno cartaz colado a um arranjo de flores secas. A sua dimensão de cartaz era reduzida, mas a mensagem que as letras manuscritas mostravam eram de um tamanho descomunal: «Guimarães é grande porque o seu povo tem memória». Mal li a frase, estremeci de imediato e um ânimo quente bafejou-me o andar. Sem mais, afaguei de leve o rosto, ignorei de propósito a elegância de um casal de estrangeiros que por mim passava, corri para o automóvel e só parei bem no centro de Fafe. Já com os pés firmes em terra, apeteceu-me dar uma volta.
Na Praça 25 de Abril, a nostalgia e a indiferença lambiam os palacetes brasileiros. Do Jardim do Calvário advinha um brilho acastanhado, timidamente evidenciado por um sol pouco quente e apenas uma meia dúzia de transeuntes meios tristes andava por ali. “ Mas que é isto?” - Gritei para comigo. “Em Fafe também há memória.
Já agora, mais uns acrescentos assertivos.
Eu sei que muito em breve vão conhecer mais pormenores e muitas certezas, mas quero falar agora. Preciso de apagar o catarro que me atrapalha a garganta. Chega de conformismos histórico-culturais. O reconhecimento de atos de valentia não pode cingir-se às prateleiras de museus, a livros escritos com garra e a fachadas pouco olhadas. É preciso mais, muito mais…
Eu sei que na nossa cidade há muita actividade cultural, facto que tem de ser dito e louvado, mas é preciso fazer mais, principalmente porque Guimarães fica mesmo ao nosso lado. Amigos, a capital da cultura está bem à nossa beira. Temos de usufruir desta dádiva de Deus.
Miguel Monteiro, Rui Adérito, João Crisóstomo, José Florêncio, Visconde Moreira de Rei, José Ribeiro Vieira de Castro e muitos outros visionários deste amor de cidade não podem cingir-se apenas a folhas e a sítios parados. Vamos lá pegar em armas mais vivas e dar ânimo às nossas memórias. Há que aprender com Guimarães, Óbidos, Santa Maria da Feira, Braga e muitas outras terras por esta europa fora, e devolver às ruas das nossas aldeias e cidade uma cultura viva. A capital europeia da cultura está mesmo ali. Não podemos ignorar esta realidade.
Amigos leitores, nos tempos que correm não podemos dar-nos ao luxo de ficarmos com o que os outros fazem e deixar as paredes das casas tombarem. Não chega metermo-nos no carro e ir visitar Guimarães. Temos de aproveitar a ocasião e trazer alguns dos muitos turistas que por lá andam a Fafe. Vamos tentar encher as nossas ruas, mostrar as nossas tradições e avivar o nosso comércio. Garanto-vos que não é preciso gastar milhões de euros com artistas vindos de longe. A nossa terra é rica em folclore, em teatro, em arquitetura, em história e em literatura. Temos duas das mais afamadas bandas de música do país, escolas de música e de bailado. Temos associações carregadas de experiência e muita tradição. As nossas escolas estão unidas, basta olhar para o que acontece nas Jornadas Literárias. A nossa terra é rica em gastronomia, paisagem, engenho, querer. A nossa terra tem alma e coração. Basta apenas um pouco mais. Basta juntarmos, com jeito, tudo o que de temos de bom e já está.
Vamos todos até Guimarães, mas tragamos, também, Guimarães até nós.
Fafenses amigos, vamos lá abrir o jogo.
Há algum tempo que um grupo de amigos, onde eu me incluo, agitados pela riqueza das nossas raízes, inspirados pela nossa herança brasileira, animados pelas III Jornadas Literárias de Fafe, que acontecerão em Março, e encorajados por algumas instituições e associações da nossa praça, anda às voltas com este assunto. Na verdade, no âmbito das jornadas literárias, surgiu a ideia de promover o evento cultural «Fafe dos Brasileiros», assente nas memórias do nosso povo. Se a ideia nasceu, de imediato a nosso querer se afeiçoou à mesma e o vento começou a soprar cada vez mais forte. De saco às costas e com uma determinação da cor do granito, começámos a bater de porta em porta, a ir de aldeia em aldeia, de escola, em escola, e o que era uma linha indefinida no horizonte, começou a tornar-se numa bela construção cultural. Em março, nos dias 16,17 e 18, se Deus e os fafenses quiserem, poderemos ser quase do tamanho do mundo, (o mundo assume o tamanho que nós ambicionarmos) e começarmos, neste ano em que o Minho está no centro da Europa, o princípio de uma longa e farta caminhada.
É tão bom lutar por um sonho em que se acredita! Eu sei que nem sempre conseguimos o que queremos, mas, e tal com diz Fernando Pessoa “Pois, venha o que vier, nunca será/Maior do que a minha alma.”
Voltando ao meu passeio do tal fim de tarde do dia 22, pelas ruas paradas da nossa cidade, quero contar-vos mais uma ocorrência curiosa. Escutem, por favor.
Na altura em estava a espiar a apatia do lago da Praça de 25 Abril e acompanhava o último queixume de uma pobre folha, o meu telemóvel tocou. Era um amigo de Bragança.
Depois de umas saudações naturais e umas pequenas frases de circunstância proferidas por amigos que já não se viam há mais de dois anos, uma pergunta vinda do outro lado da linha bateu-me de chapa no rosto:
“ – Carlos, escuta. No fim deste mês estava a pensar ir a Guimarães capital europeia da cultura. Podíamos encontrar-nos, assistir a uma ou outra iniciativa e saborear por lá uns petiscos vimaranenses. O que achas?”
Amigos leitores, eu não sei o que me deu, mas a minha resposta foi estrondosa, imediata e clara.
“ – Não, não venhas no final do mês. Vem antes em março, no fim-de-semana de 16 a 18, e aproveitas para participar, também, num grande evento cultural que irá decorrer aqui em Fafe, por essa altura: Fafe dos Brasileiros.”
Claro que o meu amigo adorou a ideia. Em março, virá ele, a família e mais um punhado de colegas, seus parceiros de profissão. Eles irão visitar a capital da cultura, mas também irão adorar conhecer a capital dos brasileiros, viajar pelos nossos museus, comprar uma lembrança, escutar as nossas famosas bandas de música a entoarem o Hino de Fafe, apreciar as nossas tradições, entender os nossos recantos provincianos, comer uma boa vitela à moda cá da terra, provar umas cavacas e refrescar-se com um bom vinho verde, (isto é apenas uma pequena enumeração). Estão a ver como é fácil espalhar uma boa notícia.
Se a Sala de Visitas do Minho souber assear-se com primor, se os seus responsáveis autárquicos souberem dar os passos acertados e fizerem a publicidade acertada, se os seus agentes económicos conseguirem espremer o sumo deste evento que se adivinha e se todos nós rumarmos no mesmo sentido, Fafe continuará grande e eterna.
Para terminar, e peço desculpa pelo tamanho desta crónica, quero dizer com a maior certeza do mundo que EM FAFE TAMBÉM NASCEU PORTUGAL.

Carlos Afonso

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